quarta-feira, 13 de julho de 2011

O sagrado universo da dança

Tenho recebido retornos bastante agradáveis das minhas postagens recentes, entre elas "Dançando com lobas". Quero esclarecer que não sou uma dançarina, alguém que tem a dança como profissão, que investe e dedica boa parte de seu tempo ao aperfeiçoamento, à pesquisa, à divulgação de seu trabalho... Sou uma "mulher dançante", alguém que tem prazer em dançar, "do jeito que for possível"! Dançar me reconecta com minha essência mais íntima e reforça sentimentos de pertencer a algo maior. E, como sou uma grande curiosa, fui buscar no passado algumas informações para entender esse sagrado universo da dança egípcia / oriental / do ventre (DV).

Houve um tempo em que as mulheres se uniam para dançar em homenagem à Deusa-mãe-natureza, ao princípio feminino, para celebrar a fertilidade, a fecundidade... e só dançavam entre mulheres (irmãs na dança, naquele momento sagrado de mover seus corpos), nuas da cintura para cima. Depois da invasão do Egito pelos árabes, aquelas mulheres foram obrigadas a dançar para os homens (muitas foram escravizadas, concubinadas, prostituídas... As que se negavam a dançar e a satisfazê-los eram brutalmente assassinadas.
Muita coisa aconteceu desde então... E a dança do ventre se espalhou pelo mundo.

Assistindo a uma apresentação de DV, anos atrás, ouvi comentários maldosos de uma dançarina a respeito de outras. Não era uma irmã de dança, e sim uma concorrente, uma "rival de dança".
Lembrei de quando fui atrás de uma escola para aprender dança do ventre (há uns 30 anos) e fui rejeitada por não ser magra, por não ter um corpo "dentro dos padrões".
Encontrei, posteriormente, um grupo de mulheres que não estava nos "padrões" e que se uniu e contratou uma professora para dar aulas particulares, no salão de uma delas.
Ao longo da vida, tive a feliz oportunidade de assistir a apresentações de dança do ventre no Brasil, na Grécia, no Marrocos e na Turquia. Fora do Brasil, as dançarinas eram barrigudinhas, rechonchudas, fabulosas! Isso me fez refletir sobre o padrão de beleza - explicita ou subjacentemente - imposto às mulheres. (Isso poderá ser tema de um novo artigo).
A cada nova apresentação a que fui, ultimamente, vi o mesmo padrão estético se impondo: seja nos cabelos (predominantemente longos e lisos), no corpo, nas roupas (algumas até exageradamente reveladoras) competindo entre si para ver quem é a mais bela, a melhor...
Penso que a dança não se resume a isso. Creio que a DV deveria ser uma celebração entre mulheres que se irmanam,  para celebrar algo, como era nos primórdios. Não havia competição entre elas. Por que algumas dançarinas modernas são tão competitivas?
Vi, com tristeza, algumas dançarinas usarem a dança para seduzir homens, transformando-os propositadamente em clientes... Acabaram criando uma fama muito negativa ao redor da DV.
[Graças a dançarinas sérias e competentes, que resgataram o lado luz e o lado arte dessa dança, isso foi se revertendo.]
Ao longo do tempo, fui perdendo o prazer em assistir apresentações que se resumiam a competições veladas e que terminavam em críticas ao corpo ou à roupa dessa ou daquela bailarina. Também perdi o prazer de assistir aulas em algumas "academias de dança" que se preocupavam mais com a aparência das dançarinas do que com sua formação.
Felizmente, há dançarinas, "mulheres dançantes" e grupos espalhados por vários cantos deste mundo, resgatando o que há de mais sagrado na dança. Grupos em que não importa a idade, a estatura, o peso e o tamanho do ventre. Tive a sorte e o privilégio de encontrar uma dessas dançarinas e seu grupo. Juntei-me a ele e danço, mesmo com os joelhos lesionados, pelo simples prazer de dançar (e com que alegria!)
Não vou me profissionalizar e não sou cobrada por isso. Erro os passos e sou lenta para aprender. Meu corpo não executa os movimentos da mesma forma que as mais jovens. Meus joelhos não me permitem fazer determinados passos. Mesmo assim, nunca ouvi uma palavra de crítica, nunca vi um olhar de condenação. A mestra acredita em mim e me incentiva a não desistir. Nas apresentações públicas, divide o palco com as aprendizes, misturada a elas. Quando a música começa, não há hierarquia. São todas irmãs na dança. E quando a música acaba, estão todas conectadas a algo muito maior, felizes por simplesmente estarem ali. Esse é o espírito da dança que eu sonho ver predominando nos palcos por esse mundo afora.
Grupo Damballah, no Festival de Dança de Curitiba (2008). Teatro Ópera de Arame. Da esquerda para a direita: Bety Damballah, eu, Mariáh, Helaine e Maria Helena.


6 comentários:

  1. Célia, hoje estou sensível e você ainda escreve um texto desses??? Quase chorei! Entrei no Damballah e não quero sair tão cedo, por todos esses motivos que você citou. Lililililiiiii!

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  2. É, minha amiga, a dança faz isso com a gente. Bem-vinda ao universo das mulheres-lobas! AUUUUUUUUUUUUUUUUUUU... LILILILILILILILILI!!!!

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  3. Aiiiiiiiiiiiiiiiii Celiaaaaaaaaaa ... não falartei nada!!! Vc sabe! Lilililiiiiiiiiiii

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  4. Lindo texto e homenagem. Que bom seria se em todos os aspectos pudesse haver essa harmonia e respeito...

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  5. Esse é o verdadeiro espírito tribal!!! ^^

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