quarta-feira, 28 de julho de 2010

Um dia pra nunca mais esquecer

O pessoal do Clube de Leitura preparou um
painel com as capas dos meus livros

Por mais que eu envelheça e esqueça das coisas, creio que jamais esquecerei o dia 27 de julho de 2010. Impossível esquecer algo que te aproxima do céu!
Fui visitar a EMEF Elias Shammass, na Cidade Tiradentes (SP) -- cujos alunos leram meus livros (todos eles) -- e conversar com as crianças, os professores e a turma do Clube de Leitura.
A recepção que tive foi digna de estrela de TV!!! Mal saí do carro, ouvi uma voz da janela gritando para dentro da escola: "Ela é bonita!"
Agora entendo o que as celebridades sentem. Mas tenho uma vantagem sobre várias celebridades: meu público! CRIANÇA é tudo de bom e quando ama algo e alguém é amor em estado puro. Fui abraçada, beijada e olhada como se fosse um presente todo especial.
Mal sabiam elas que o grande presente quem recebeu fui eu. Um escritor só existe porque existe quem o leia.
Contando uma história...
Disse a elas: "Vocês são a razão de eu ser escritora. Se vocês não lessem meus livros, eu não estaria aqui." Um menino me disse que pensou que eu não existia de verdade. Lembrei de meu amigo, escritor de primeiríssima linha, José Ricardo Moreira, que foi cutucado por um aluno numa escola e ouviu dele: "Você tá vivo!"
É muito divertido ver como os escritores têm uma aura de isolamento e inatingibilidade. Isso me incomoda. Fiz questão de fazer as crianças me tocarem e disse: "Eu existo, sim, em carne e osso. Mais carne do que osso, por sinal!"
Respondi muitas e muitas perguntas, vi olhinhos brilhantes, curiosos, recebi sorrisos, homenagens, desenhos, cartinhas, bilhetes, carinho, amor, amor, amor, amor... Não consegui me segurar e chorei meeeesmo, de pura emoção.
Os alunos do Clube de Leitura me entrevistaram. Fui filmada. Escrevi mais de 300 autógrafos.
Com a galera do Clube de Leitura e professores
Contei histórias, dancei, enfim... fui por um dia a escritora mais popular e feliz que já existiu. Era como estar na entrega de um prêmio. Lucinha, coordenadora do Clube de Leitura, e Samuel, membro distinto do Clube de Leitura, aprontaram para mim. Ele ajudou a organizar tudo e ciuidou da parte tecnológica, além de fazer um número musical bárbaro. Também pesquisou meu blog em busca de informações e fotos e com elas montou uma apresentação mostrando um pouco da minha vida, minhas viagens, meus sonhos e da minha família (mostrando que sou gente como qualquer outra pessoa) me deixando sem fôlego. Lucinha foi às escondidas em casa e filmou depoimentos dos meus pais. Quando vi os velhinhos, na apresentação, falando da filhota escritora, quase tive um treco.
"Meu Deus", pensava, "eu não sou famosa, nem especial, nem uma escritora de projeção para merecer tantas honrarias". Mas, para eles, eu fui a primeira escritora que pisou naquela escola. Então, para eles, eu era, sim, muito especial.
Impossível contar todas as emoções sentidas e vividas. Teria de escrever muitas postagens para dar uma pálida noção da grandiosidade daquelas pessoas (alunos, professores, coordenadores, diretores, assistentes...) e o trabalho que eles desenvolvem ali, apesar de muitas dificuldades.
Uma das homenagens recebidas
Saí de lá transformada, mexida e assustada com a responsabilidade de escrever e ser lida, de ir a uma escola, contar histórias, mostrar quem sou, falar o que penso, abrir o coração, dar minha opinião sobre assuntos diferentes...
Voltarei a escrever sobre a EMEF Elias Shammass e seus "encantadores de escritores" mais vezes, futuramente. Por ora, só posso dizer que nunca imaginei receber tanto, e com tanta qualidade, num mesmo dia. Por sorte, não sou cardíaca, caso contrário, meus leitores teriam de se contentar com autógrafos psicografados.


quinta-feira, 22 de julho de 2010

Golpistas me dão nos nervos! - Parte 2

Pois é... Há algumas semanas alertei sobre o golpe do cartório e hoje alerto para outro tipo de golpe: O do acidente de trânsito.
Dessa vez a vítima foi meu pai. (Uma santa criatura que acredita nas pessoas.) Ele recebeu uma chamada a cobrar e atendeu. Do outro lado do telefone, um rapaz disse: "Tio?". A voz era muito parecida com a de um sobrinho. "Fulano?" perguntou papai (Aí o golpe estava garantido!). O rapaz falou que havia batido o carro e que o dono do outro veículo era um advogado. Como o sobrinho não tinha seguro, o advogado o levou até uma oficina e fez um orçamento. Disse que não o deixaria sair de lá até que ele levantasse o dinheiro para pagar o funileiro. O sobrinho, então, pediu: "Tio, o senhor me empresta parte do dinheiro? Preciso que o senhor deposite na conta do funileiro". Deu nome e uma conta de poupança. Meu pai, solícito e preocupado, nem questionou. Foi ao banco, sacou dinheiro e foi à Caixa Econômica fazer o depósito. Mais tarde, o sobrinho ligou novamente e falou com minha mãe. Ela, toda aflita, perguntou: "Você se machucou?" "Só um pouquinho, tia, levei dois pontos na boca e machuquei o joelho." "Passa aqui em casa pra eu ver como você está". E começou a chorar, penalizada pela situação do afilhado querido. O rapaz, percebendo que ela estava fragilizada, desferiu novo golpe: "Tia, preciso pagar o restante do dinheiro pro funileiro. A senhora pode me emprestar?" "Passa aqui em casa, meu filho". "Não posso sair daqui, tia, a senhora tem de ir ao banco fazer o depóstito." Aí uma luz acendeu na mente ainda lúcida de minha mãe. O afilhado sabe que ela tem problemas de locomoção e jamais pediria que ela fosse ao banco. A empregada alertou: "Isso tá com cheiro de golpe". Desconfiada, ela finalizou: "Ah, meu filho, liga mais tarde e fala com o seu tio. Eu não estou me sentindo bem. Tchau!"
Quando meu pai e minha mãe foram averiguar a veracidade dos fatos, já era tarde. O dinheiro já havia sido depositado. O verdadeiro sobrinho não estava nem em São Paulo e não houve acidente algum. O policial que fez o BO disse que as quadrilhas têm variado bastante os golpes e que é demorado encontrar os meliantes, mas que eles acabam sendo capturados. [Já o dinheiro e a confiança na raça humana... vai ser difícil recuperar...]

sábado, 17 de julho de 2010

Novas aventuras de Namor, o príncipe submarino

Meu mano Big Paul, ou "Namor", o herói das profundezas, foi mergulhar nada mais nada menos que nas ilhas Galápagos. Se você está olhando para cima, apertando os olhos e se perguntando "Onde é que eu já ouvi esse nome antes?", provavelmente foi numa aula de Biologia, quando o professor ou professora ensinava sobre um certo senhor chamado Charles Darwin, que estudou os animais dessas ilhas (e de outros lugares) e escreveu sua teoria sobre a evolução das espécies. Lembrou agora? (Este blog também é cultura, oras!)
Pois bem, Big foi ver in loco o tubarão baleia, um gigantesco ser que habita aquelas paragens. Quando perguntei a ele sobre as fotos, mandou-me três. Reclamei: "Pô, mano, só isso? Cadê aquelas fotos que você prometeu mandar?". Depois de uma ligeira pausa, ele deu um suspiro e respondeu: "Fiquei sem a câmera" (aquela de última geração, com recursos incríveis e que ele ainda estava pagando em prestações). "O que houve, ela pifou?" "Não, foi engolida por um Silk..."
EU: Hein? Sik? O que é um Silk?
NAMOR: É um tubarão Silk.  Eu estava fotografando e filmando o tubarão baleia quando a máquina se soltou da minha mão e subiu. Quando eu ia pegá-la, só vi uma mancha marrom passar zunindo sobre mim e abocanhar a máquina. Não deu tempo de salvar.
EU: Hã? E como a máquina flutuou?
NAMOR: É que a concentração de sal naquela região do Pacífico é bastante alta, fazendo tudo flutuar. (Não disse que esse blog também é cultura?). O tubarão Silk está sempre rondando os barcos e os grupos. Ele costuma abocanhar tudo o que cai na coluna dágua (tudo mesmo).
Não resisti e caí na gargalhada. "Quer dizer que o tubarão Silk é o esfomeado trombadão dos oceanos? Caramba, ele deve ser parente do crocodilo do Peter Pan e da baleia do Pinóquio!!!"
Claro que o Big não achou graça nenhuma. É a segunda câmera que desaparece no fundo do mar este ano. Pra mim, ele andou fotografando o que não devia e a câmera foi confiscada pelos homos mermanus. No caso dele, tenho certeza de que esse roubo foi encomendado. Essa história de ficar fotografando tubarão baleia... não sei não... com certeza aí tem barbatana de algum tubarão dos grandes...
Falando sério, o glutão engoliu "trocentas" fotos preciosas, além de vídeos. Big carregará na memória tudo o que viu, e o famélico Silk, se tudo der certo, terá a pior indigestão de sua existência, sem direito a sal de fruta!
Pois é... Nem no fundo do mar a gente escapa do latrocínio. Isso lá é evolução, senhor Darwin?



Procura-se

Tubarão Silk de 3,5 metros, acusado de latrocínio e receptação de mercadoria roubada.
O meliante é perigoso e costuma, literalmente, comer as evidências e as testemunhas.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Família, família...

O IBGE diz que família são as pessoas que vivem sob o mesmo teto (mesmo que não sejam parentes consanguíneas). Aprendi que família é quem cuida da gente, morando junto ou não.
O fato é que o conceito de família pode ter diferentes definições dependendo da cultura e das crenças de cada um. É adequado respeitar todas elas (mesmo não concordando).
Família pode ser grande ou pequena, mononuclear ou não. Tradicional ou disfuncional (creio que todas têm um pezinho na disfuncionalidade). Pode ser ampliada ou reduzida, de acordo com as circunstâncias.
Quando eu era pequena e a família se reunia para um evento, parecia gigantesca. Com o passar dos anos, alguns foram para longe, outros sumiram, outros fizeram "a" viagem... Os que casaram, agregaram cônjuges, filhos. Alguns se divorciaram, casaram novamente, tiveram outros filhos. Mas algumas perdas marcam, como tios, tias, padrinhos, tios "adotivos"...
No aniversário de 81 anos de minha mãe, foi possível reunir alguns membros da família. Nem sombra do que era, dada a distância dos parentes e um triste distanciamento entre alguns integrantes (mesmo morando perto).
O ponto alto do dia foi quando chegou um casal, com cara de "Acho que erramos de festa". A esposa, segurando uma bebê no colo, comentou: "Será que é a festa certa?". Eu, querendo ser simpática, perguntei: "Vocês vieram para a festa da Dona Regina?". Diante da resposta afirmativa, sorri e disse: "Muito prazer, sou a filha dela, Célia". O homem respondeu: "Muito prazer, sou seu primo Carlos".
Eu não havia reconhecido o primo com quem brincava na infância e não via há uns 30 anos!!! Todo mundo caiu na gargalhada. Fiquei muito sem graça, e depois que reparei bem nele reconheci o primo-garoto de antes. Ele comentou: "Não tem jeito, prima, a gente se distanciou mesmo". É verdade, mas devo reconhecer que quem se afastou mais fui eu. Morando longe, deixei a distância ganhar força. Percebi que não me mantive conectada ao grupo, ao contrário de meu irmão e minha irmã. Tudo bem que a distância dificulta, mas não impede um contato. Mesmo quando não há intimidade, pode haver um "fazer-se presente".
Assim é a vida. A gente vai e vem, se afasta e se reencontra. E como é bom reencontrar pessoas de quem a gente gosta (ou costumava gostar).
Sei que vou continuar avoada, desligada e viajante, ainda quero ir pra longe,conhecer terras distantes. Mas agora vou carregar a família comigo, em fotos, porque descobri que meu gravador de alma está com pouquíssima memória!

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Vida, mães, pais e envelhecimento

Um dia você se dá conta de que envelheceu. Até aí tudo bem. Envelhecer faz parte do "pacotão" chamado VIDA. As feições mudam, os cabelos ficam ralos, algumas dores oportunistas se anunciam, você percebe que tinha células adiposas em lugares "nunca dantes navegados"... Até aí tudo bem também. O difícil, algumas vezes, é encarar que, assim como você, as pessoas que você ama também envelheceram. Não falo das sobrinhas que até ontem andavam dando pulinhos e gritinhos, com as fraldas aparecendo debaixo dos vestidinhos floridos, que adoravam as bonecas e pulseiras com brilho que ganhavam e que hoje conversam sobre namorados, ficar, beijar na boca, etc., etc... Isso também faz parte do pacote ou, como diz meu irmão, "tá embutido no preço da passagem".
Quando seus pais entram na casa dos 80 anos e os problemas de saúde mais simples se tornam verdadeiras ameaças e a casa que durante anos foi reino e domínio deles se torna uma armadilha para tombos, quedas e outros acidentes, é preciso respirar fundo e aceitar que nada mais será como antes. [Já não era, mas você preferia evitar pensar no assunto.]
Sentada no chão do quarto de meus pais, fiquei olhando para o rostinho emagrecido e enrugado de minha mãe. Voltei no tempo uns 25 anos, quando um cardiologista vaticinou que ela teria poucos meses de vida. Todas as manhãs eu corria até o quarto para verificar se ela estava respirando. Foram meses de medo e tensão. Depois de um ano, relaxei. Depois de dois anos, esqueci.
Volto para 2010. Agora olho para meu pai que, graças a uma compleição de super-herói, passou praticamente ileso por um AVC. A taxa de glicose, no entanto, saltou: ele está, oficialmente, diabético.
Um amigo me disse: "Depois de uma certa idade, as coisas mudam. Vá se preparando..."
Impossível se preparar para o que quer que seja.
Só sei que curto cada instante com eles. Tenho vontade de agarrar os dois e ficar abraçada até eles se cansarem. Quero guardar o cheirinho deles. O olhar. O sorriso. Guardá-los, eternizá-los DENTRO de mim.
Outro dia pulei na cama deles como quando tinha 5 anos. Eles voltaram a ter 30. Rimos muito. [O riso rejuvenesce.]
Então, quando me olhei no espelho, vi uma mulher de mais de 40 anos que tinha virado menina de novo. E essa menina agora caminha lentamente, todas as manhãs, até o quarto dos pais para verificar se eles estão respirando...

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Chega do faça você mesmo...

Cada vez mais percebo o quanto somos pressionados a ser completos, autossuficientes, perfeitos, independentes, onipotentes e... econômicos... Mas a que preço!!!
Vivendo sozinha há muito tempo, acabei tendo de aprender a fazer pequenos consertos e ajustes que antes deixava de bom grado para um espécime do gênero masculino.
Também acabei aprendendo a fazer tarefas atribuídas, mais especificamente, ao gênero feminino, tais como depilaçao, pedicure e manicure...
Posso dizer com toda a certeza que CANSEI!!!
Reconheço que é ótimo ver algo feito por você mesma e se exibir para os amigos e amigas, mas nem sempre o trabalho e o empenho valem a pena. Alguns resultados ficariam muito melhores nas mãos de profissionais qualificados e experientes.
Comecei trocando o sifão da pia. "Moleza", pensei. Apertei a braçadeira o máximo que pude e fiquei sorrindo, admirando o resultado. Duas horas depois estava com a cozinha completamente alagada. A braçadeira escorregou, o sifão saiu do lugar e eu só percebi quando a água já estava fazendo uma pequena cachoeira no paneleiro. Para completar a cena, a porta do armário de copos caiu na minha cabeça, pois os parafusos que a seguravam se soltaram. Quando fui abrir o armário para pegar uma jarra, ganhei de presente um galo na cabeça.
Depois cismei de pintar as paredes do meu apartamento e o teto do banheiro. Nem vou repetir aqui o que já descrevi num post anterior. Ainda tenho dores nas costas por conta do mau jeito na escápula (antiga omoplata). Mas o efeito da tatuagem na parede ficou fenomenal. Ponto pra mim!
As últimas investidas foram um pouco menos dolorosas, do ponto de vista físico, mas devastadoras no aspecto moral.
Quis modificar minha sobrancelha, que nas priscas eras era comparada à da Malu Mader ou à do Mazzaropi, quando eu deixava crescer.
Peguei minha pinça alemã (um fenômeno, segundo a atendente da loja de cosméticos que me vendeu) e me atirei ao trabalho. Usei um super espelho de aumento para enxergar os pelos de perto. Parecia mesmo uma selva.
Quando terminei, achei que algo estava estranho, mas não me toquei do que poderia ser. Já era madrugada e eu estava cansada demais. Fui dormir e até esqueci das sobrancelhas.
No dia seguinte, ao entrar no banheiro descabelada e com a cara mais amassada do mundo, tomei um susto danado ao ver a versão feminina do Jack Nicolson em "O Iluminado" no espelho. No lugar do machado, uma pinça assassina. As crianças do prédio me evitaram durante dias. [Será que foi por isso?]
Fui desencravar a unha do dedão, durante o jogo do Brasil. Na hora do primeiro gol contra nem sei quem levei um susto tão grande que arranquei um bife enorme. Inflamação... dor...
Não satisfeita, resolvi fazer a "Brazilian Wax" (Depilação brasileira - total) sem a wax (cera). Usei um depilador que arranca os pelos. (Por favor, tirem as crianças da frente do computador. O assunto vai ficar constrangedor, mas nada cabeludo). Por pouco não arranquei os pequenos e grandes lábios também. Descobri que naturistas e hippies não se depilam. Aderi à causa.
Uma das últimas investidas foi refazer a decoração do quarto. Sempre alimentei o sonho de ter uma cama com dossel. Mas não um dossel qualquer e sim um que lembrasse a cama da Elizabeth Taylor/Cleópatra no filme homônimo. Creio que era uma cortina de tule, de seda, de algo translúcido... Enfim, encontrei na internet um  mosquiteiro modelo dossel de teto que se encaixava no meu bolso e nos meus sonhos. Encomendei o dito-cujo e aguardei a entrega. A empresa envia uma guia de papelão para colar no teto e marcar os locais dos furos, um guia de como instalar, buchas, parafusos e até a broca para a furadeira!!!
Peguei a furadeira emprestada do porteiro e pedi uma escada para a vizinha de cima. Avisei a ela que faria barulho para colocar quatro parafusos no teto. Caso ela ouvisse algum barulho estranho, além da broca da furadeira varando o teto que, por favor, corresse para me acudir. Provavelmente eu estaria em apuros.
Pra começar, a guia de papel se embolou e na hora de prender eu a rasguei. Além disso, ela era para uma cama king size. Minha cama, além de ser japonesa, no chão, é tamanho padrão. Nessas horas eu me arrependo de ter dormido nas aulas de matemática, geometria e física. Fiz cálculos complicados tentando achar a distância do ponto equidistante ou o meridiano da cama em relação à parede... [Aaaai, que sono!]
Bem... resumindo, acabei marcando os locais dos furos utilizando o método científico mais antigo que existe: o "DSPA" (Deve Ser Por Aqui).
Furadeira em punho, broca encaixada, comecei o primeiro furo. Uma manteiga! Sorri satisfeita e pensei no quanto as mulheres se fragilizam perante os homens, deixando que eles façam coisas simples que elas mesmas poderiam fazer... (Como fui tola!)
Na hora de fazer o segundo furo, a broca só entrou até a metade. Havia uma viga de concreto entre a broca e o final do furo que eu queria fazer.
Pensei: "É só deste lado. Vou furar do outro lado. Acho que a viga de concreto sacou meus planos e se mudou para o outro lado. A broca nem entrou. Fiquei tentando furar e não consegui. Interfonei para o porteiro. "Oi, sr. D. Tudo bem? Tem certeza de que sua furadeira é das mais potentes? Ela não está furando!". Do outro lado vieram a risada, a resposta e duas perguntas: "Essa furadeira é profissional. A senhora está usando broca de concreto ou de madeira?  Está usando o martelete?".  (Broca de concreto? Martelete?) Diante de meu mutismo, o sr. D. me pediu que levasse a furadeira e a broca para ele ver. Não podia sair da portaria naquele momento. Fui até lá e ele pacientemente checou a broca (Sim, era de concreto) e me ensinou a usar as duas funções da ferramenta: a furadeira simples e o martelete. "A senhora não quer que eu fure? Depois do serviço eu posso ir lá". "Não é preciso, obrigada. Agora eu já sei o que fazer." "Voltei para o quarto, coloquei a furadeira na tomada, girei a chave para a função martelete, subi na escada como um atleta sobe no pódio e liguei a danada. Quase caí no chão por conta dos marteletes e socos que a broca deu no concreto. O buraco ia alargando, mas não aprofundando, como seria o correto. Os braços doíam. Parei. O interfone tocou. "Alô!". Do outro lado, a vizinha, com voz preocupada, aconselhava: "Celinha, tá tudo bem aí? Você tá com dificuldade, né? Não ouvi o barulho certinho dos quatro furos... Chama o seu D. pra furar pra você." É verdade. Até pra fazer furos existe um jeito certo. Intefonei para o sr. D. e pedi que fosse fazer os furos. Meus braços tremiam por conta da força descomunal que fiz  - tentando vencer o concreto empurrando a broca... tolinha!!!
Em 15 minutos ele fez os três furos que eu penei pra tentar fazer em mais de uma hora.
Nem me cobrou nada. Só sorriu. Ah! Esqueci de dizer que resolvi checar se a broca estava bem encaixada e queimei os dedos. Ninguém me avisou que o atrito do metal no concreto produzia tamanho calor. [Ou será que perdi essa aula enquanto dormia?]
Na hora de pendurar o mosquiteiro, um pequeno contratempo: um gigantesco lustre vietnamita bem em cima da cama. E agora? Era preciso fazer um pequeno furo no mosquiteiro para passar a fiação do lustre e assim deixá-lo dentro do dossel. Vou poupar você, leitor(a) de detalhes, mas imagine alguém que acaba de desligar a chave geral do quadro de luz - porque vai mexer com os fios desencapados do lustre e passá-los  por um minúsculo buraquinho feito no mosquiteiro, a fim de não estragá-lo muito -, com medo de tomar choque, tentando enxergar alguma coisa num quarto na penumbra, trepada numa escada do tipo "balança mas não cai". (Minha amiga S. diz que eu tenho mais sorte que juízo). Resultado: essa criatura deixou o lustre cair e a lâmpada se espatifou no chão.
Caramba, esse post está ficando parecido com aquele comercial da faca Ginsu. (Pensa que acabou? Nãããão! Não mande dinheiro agora, pois ao comprar este jogo de facas você ainda recebe a maravilhosa picadora de legumes...). Ou seja: calma que tem mais...
Voltando ao quarto: depois de penar, pendurei o mosquiteiro. Varri o chão, juntei os caquinhos da lâmpada, tirei o pó, arrumei as pedrinhas em volta da cama, coloquei os abajures (que eu mesma fiz, com esteirinhas de bambu), as velas... enfim, ajeitei o quarto como pude. Queria um ambiente relaxante, quase um spa.
O dossel-mosquiteiro, nem preciso dizer, ficou torto. Um lado pende mais que o outro e, na cabeceira, ele ficou muito em cima do travesseiro. "Pois vai ficar assim mesmo", bufei.
Passado mais de um mês dessa aventura, concluí que de nada adianta ter uma cama de princesa se você não é uma princesa.
Por três vezes, ao acordar e me espreguiçar, enrosquei o braço, a mão ou o relógio no dossel e ele veio abaixo. Fiquei presa debaixo dele como um peixe na rede. Poderia até bancar a superior e dizer que fiquei presa como uma sereia na rede, mas sou honesta. Mentir é feio. Quando acordo posso parecer muitas coisas, menos uma sereia. Na verdade, senti-me como a Dolly, o pai do Nemo e as sardinhas do desenho animado, na cena do barco de pesca puxando a rede.
Agora, o dossel sai do bocal do lustre. A cada enroscada e queda ele cede um pouco. Começo a achar que qualquer dia desses vou acabar com o raio do dossel enrolado na minha cintura... como um tutu. Aí, com certeza, saberei que dancei!